Setor agropecuário argentino à espera das eleições de 2016

Toda vez que são feitas projeções sobre a necessidade de se produzir mais alimentos para atender à expansão da população mundial, os produtores argentinos têm a sensação de estar no lugar certo. Na última década, entretanto, as condições favoráveis do clima e da geografia de seu país foram insuficientes para compensar políticas restritivas às exportações, que se refletem na queda da produção.

A carne bovina é um dos melhores exemplos do declínio do agronegócio depois que o governo iniciou o controle das vendas ao exterior para evitar aumento de preços no mercado interno. Desde 2006, a Argentina passou de 3º a 12º exportador global de carne bovina.

O volume de vendas externas previsto para este ano - 180 mil toneladas - é quatro vezes menor que em 2005 (745 mil), segundo a Câmara da Indústria e Comércio de Carnes e Derivados da República Argentina (Ciccra). A tendência de queda se acentuou no segundo semestre de 2013 e, segundo a mesma entidade, o total exportado de janeiro a junho deste ano ficou 13% abaixo de igual período de 2013.

Como ocorre com as demais estatísticas do país, também no setor agropecuário os cálculos e projeções de consultores privados costumam revelar resultados abaixo dos dados oficiais. Segundo o Ministério da Agricultura, a exportação de carne bovina em 2013 alcançou 201,7 mil toneladas, 6 mil toneladas mais do que nos cálculos do setor privado.

Segundo a Sociedade Rural Argentina, chega a US$ 76 bilhões o total de recursos que não entrou no país desde 2002 por conta do controle às exportações do setor. "Esse valor seria suficiente para construir 33 mil quilômetros de estradas", diz o chefe do instituto de estudos econômicos da Sociedade Rural, Ernesto Ambrosetti. Segundo ele, por conta da carga tributária a fatia do Estado na renda agrícola chega a 75%.

Além da pressão fiscal, o setor também perde com o câmbio. Evitar que os exportadores de grãos segurassem a colheita foi um dos motivos que levaram o Banco Central a provocar a desvalorização do peso em 25% em janeiro. Mas, desde então, a inflação chegou a quase 15%.

O trigo é um dos principais alvos das restrições às exportações, que buscam combater a alta dos preços domésticos da farinha. A safra de 2014 será a menor dos últimos 135 anos, segundo a Sociedade Rural.

Para os especialistas, a política pesa no de plantio. "No trigo, esse peso é de 100%, porque ninguém vai querer produzir o que não vai conseguir vender", afirma Ricardo Negri, responsável pela unidade de investigação e desenvolvimento da Associação Argentina de Consórcios de Experimentação Agrícola (Aacrea).

O confronto continua a marcar as relações do setor agropecuário com o governo kirchenerista. "Se algo ficou claro durante os últimos 11 anos é que hoje sabemos o que um governo não deve fazer", disse o presidente da Sociedade Rural Argentina, Luis Miguel Etchevehere na sexta-feira, durante a mais tradicional e maior exposição rural do país.

A situação econômica tende a se agravar se o país entrar em "default". No dia 30 termina o prazo para o governo fechar acordo com os credores da dívida externa que rejeitaram a reestruturação. Mesmo assim, os analistas creem no potencial de recuperação. Com base em análises pessimistas e otimistas, a Aacrea traçou um cenário para grãos e carne nos próximos cinco anos.

Segundo o trabalho, a produção anual de grãos poderá passar das atuais 100 milhões de toneladas para entre 124 milhões a 157 milhões. Em carnes, as projeções indicam crescimento da produção de 22% a 52%. Isso significa passar de 2,8 mil toneladas deste ano para até 3,8 mil. "Ninguém imagina que esse país produzirá menos", diz Neri.

No meio do caminho, estão os 18 meses que ainda restam do mandato de Cristina Kirchner, sem direito à reeleição. Os empresários do campo, que não dialogam sequer com a equipe de Agricultura de Cristina, têm, assim, pela frente, um grande desafio - de paciência e resistência.

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