Nas vésperas dos Jogos Olímpicos de Atlanta 1996, Romário estava em campanha para ser convocado a disputar o título que faltava a ele e à Seleção Brasileira. Zagallo - técnico do Brasil e também da equipe olímpica - preferiu o zagueiro Aldair, o meia Rivaldo e o atacante Bebeto como os jogadores com mais de 23 anos para o time. Admirador do Baixinho, participei de um debate onde critiquei a opção com o seguinte argumento: “Quem vai botar a bola debaixo do braço, dizendo ‘vamos virar’ quando a Argentina fizer 1x0 na decisão da medalha de ouro?”. Bebeto e Rivaldo, referências de talento do time, jamais fariam isso: nunca tiveram a personalidade para fazer o papel de líder.
É muito difícil o mesmo jogador ser o craque que conduz o time por seu talento e capacidade técnica e o capitão que comanda os companheiros por sua personalidade e liderança. Romário tinha essas qualidades: seria capaz de botar a bola debaixo de braço e liderar o time para uma virada. Para sair do Brasil, Diego Maradona exercia uma liderança tão forte que verdadeiros seguidores e até uma igreja para cultuá-lo na Argentina.
Alejandro Sabella, técnico da seleção até a Copa do Mundo, botou Lionel Messi como capitão argentino com o objetivo de torná-lo mais participativo no time, forçar o craque, referência de talento, a falar mais com os companheiros. Messi parece ter ficado menos tímido e mais falante com a camisa da seleção, mas a Argentina, na verdade, tem dois capitães. No vestiário, como em entrevistas nos momentos delicados, a voz mais ouvida é de Javier Mascherano - ‘o capitão sem braçadeira’, como o chama a imprensa argentina - que ocupava a função até 2011. Mascherano, chamado pelos companheiros de Jefecito (Chefinho), é quem grita com os companheiros em campo, quem contesta o juiz, quem chega à beira do campo para conversar com o técnico.
Ao alçar Neymar a capitão do time, Dunga explicou que escolhera o jogador por ser a referência do futebol brasileiro e experiente apesar da idade. Particularmente, acho que o nosso craque - hoje talvez o único jogador brasileiro de futebol a merecer essa qualificação - já tem responsabilidades demais em campo. Como Messi, sofre marcação sempre dura, é sempre o mais acionado pelos companheiros, sofre muitas faltas. Mas, ao contrário de Messi, não tem um Mascherano para ajudá-lo a comandar o time. E Neymar também é diferente de Messi em outros aspectos: tem pavio mais curto, irrita-se com mais facilidade. Talvez pela juventude, talvez pelo temperamento mesmo. Dunga - que nos tempos de jogador exercia uma liderança como a de Mascherano - precisa arranjar um Dunga, para ajudar Neymar a liderar a seleção. E o craque, com ou sem braçadeira, deve ficar mais concentrado em comandar o time com a bola no pé.
Punição justa
A suspensão de Neymar por quatro jogos pela Conmebol não é exagerada: ele chutou a bola em um adversário com o jogo parado - o que já seria caso de expulsão - e deu uma cabeçada em outro.
Dunga, o subestimado
A fama de xerife e a identificação com o fracasso na Copa do Mundo de 1990 levaram o atual técnico do Brasil a ser considerado, principalmente para os mais jovens que não acompanharam a carreira, um jogador medíocre. Não era: o volante Dunga tinha a reconhecida capacidade de marcação, boa visão de jogo, passe acima da média, chute forte. Era superior a Mauro Silva, Cesar Sampaio, Gilberto Silva, Emerson, Felipe Melo, Paulinho, Luiz Gustavo, Fernandinho, Elias e outros que ocuparam ou ocupam suas funções na seleção.
Memória olímpica
Vou voltar ao primeiro parágrafo: em Atlanta 1996, Brasil e Argentina eram os principais candidatos ao ouro olímpico. Nossa seleção tinha campeões mundiais de 1994 (Bebeto, Aldair e Ronaldo) e futuros campeões em 2002 (Dida, Roberto Carlos, Juninho Paulista, Luizão e o próprio Rivaldo, craque da conquista do penta). Os argentinos tinham Ayala, Zanetti, Simeone, Ortega e Crespo entre outros que brilhariam no futebol. O Brasil, na semifinal, e a Argentina, na final, perderam para Nigéria, que ficou com o ouro. Os argentinos ganhariam o bicampeonato olímpico em 2004 - com Mascherano, D’Alessandro e Tevez - e 2008, com Messi, Di Maria e Aguero. E Mascherano, com mais de 23 anos, para liderar. O Brasil ainda busca o ouro. E faltam 411 dias para os Jogos Olímpicos do Rio 2016.