Noventa e sete anos depois de apresentar a primeira longa-metragem de desenhos animados, El Apóstol, do realizador Quirino Cristiani, a Argentina revela agora com Matraquilhos - estreia-se amanhã em Portugal - que existe animação longe dos estúdios norte-americanos da Pixar, da Disney ou da Dreamworks. E o realizador Juan José Campanella é parte dessa revelação.
A primeira surpresa do filme argentino (em coprodução espanhola) mais caro de sempre (custou 20 milhões de dólares) chega logo na cena de abertura, uma homenagem a 2001 - Odisseia no Espaço (1968), de Stanley Kubrick. E, apesar de Matraquilhos ser o primeiro filme de animação do realizador argentino, e também o seu primeiro trabalho em 3D - versão que não chega a Portugal - traz um tema tão familiar como o futebol, visando um público juvenil. E Campanella conseguiu preservar as suas marcas pessoais, presentes em filmes como O Filho da Noiva (2001) ou O Segredo dos Seus Olhos (2009), esta última uma ficção de imagem real com a qual conquistou um Óscar para Melhor Filme Estrangeiro. A nostalgia de um passado mais complacente, em paralelo com a falta de confiança no progresso, o afeto por personagens desajustadas, o conflito entre pais e filhos ou um romance impedido pela timidez: todas estas características da obra de Campanella estão presentes em Matraquilhos. O realizador, de 54 anos, e que tem uma carreira sólida nos EUA - realizou séries de TV consagradas como Dr. House ou Law Order -, confessou há algum tempo não gostar muito de futebol. O que é surpreendente vindo de um argentino que já em O Segredo dos Seus Olhos filmou uma sequência num campo de futebol. Depois de ver Matraquilhos, essa confissão parece incredível já que a última meia hora do filme é, nada mais nada menos do que... um jogo de futebol! O cinema transforma-se num estádio. E ali há resoluções: o amor de uma mulher, o destino de uma cidade, o valor da dignidade e uma desavença com muitos anos entre o campeão de matraquilhos e o melhor futebolista do mundo. Campanella, que também colaborou no argumento e produção, optou por uma versão diabólica do "empresário" mostrando a visão que tem do futebol atual.