quinta-feira,
9 abril, 2015 - 8h55
Os 17 países-membros da colaboração
Pierre Auger, incluindo o Brasil e a Argentina, selecionaram
uma proposta de aprimoramento do maior observatório
de raios cósmicos em operação no mundo,
instalado em Malargüe, na província de Mendoza,
na Argentina, a 1,1 mil quilômetros de Buenos Aires.
Detalhes da proposta foram apresentados em uma mesa-redonda
sobre grandes colaborações científicas
realizada na quarta-feira (08/04) durante a FAPESP Week
Buenos Aires.
Realizado pela FAPESP em parceria com o Consejo Nacional
de Investigaciones Científicas y Técnicas
(Conicet), o evento reúne até a próxima
sexta-feira (10/04), em Buenos Aires, pesquisadores do Estado
de São Paulo e de diferentes instituições
de ensino superior e de pesquisa da Argentina, com o objetivo
de discutir o aumento da colaboração científica
entre os dois países.
Pierre
Auger Observatory
Observatório
Pierre Auger estuda os raios cósmicos ultraenergéticos
que chegam até a Terra medindo os chuveiros atmosféricos
extensos produzidos por eles na atmosfera
“O
Observatório Pierre Auger é um bom exemplo
de uma grande colaboração científica
internacional, com a participação efetiva
da Argentina e do Brasil no projeto, construção,
operação e desempenho do sistema de detectores
ao longo destes dez anos”, disse Carola Dobrigkeit
Chinellato, professora do Instituto de Física Gleb
Wataghin (IFGW) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp),
à Agência FAPESP.
“A proposta de aprimoramento do Observatório
Pierre Auger permitirá melhorar sua capacidade tecnológica
para que possamos complementar os dados das partículas
cósmicas de ultra-alta energia que estamos extraindo
com os detectores que temos atualmente no observatório”,
avaliou Chinellato, que preside a Comissão de Publicações
do Pierre Auger.
O observatório astronômico, que entrou em
operação com tomada de dados em 2004, após
mais de dez anos de planejamento, conta com a participação
de cerca de 500 cientistas, provenientes dos 17 países-membros
da colaboração. O Brasil tem cerca de 5% de
participação no projeto e a Argentina, aproximadamente,
8%.
A
participação dos pesquisadores do Estado de
São Paulo na colaboração é apoiada
pela FAPESP. Já a participação
de pesquisadores de outros estados é financiada por
outras agências de fomento à pesquisa do país.
“O Brasil e a Argentina são os principais
parceiros da colaboração Pierre Auger”,
afirmou Alberto Etchegoyen, diretor do Instituto de Tecnologia
em Detecção e de Astropartículas da
Comissión Nacional de Energia Atómica (CNEA),
da Argentina, em palestra durante o evento.
De acordo com os pesquisadores participantes da colaboração,
o Observatório Pierre Auger permitiu observar ao
longo dos dez anos de operação dezenas de
raios cósmicos na região de energia acima
de 1020 (cem bilhões de bilhões) de elétrons-volts
(eV) e confirmou que há uma forte supressão
do fluxo de raios cósmicos que chegam à Terra
com energias mais altas, acima de 5,5 x 1019 (55 bilhões
de bilhões) de eV.
Uma das principais questões que os pesquisadores
participantes do Pierre Auger tentarão responder
por meio do plano de aprimoramento do observatório
é qual a origem da supressão do fluxo dessas
partículas subatômicas mais energéticas
conhecidas na atualidade.
Dessa forma, será possível diferenciar se
a supressão é devida a perdas de energia durante
a propagação extragaláctica ou se é
consequência da existência de um limite máximo
de energia das partículas em suas fontes galácticas
ou extragalácticas.
“Ao identificar a causa da supressão do fluxo
será possível encontrar fontes ou regiões
de fontes de raios cósmicos de ultra-alta energia”,
estimou Chinellato.
“A chave para atingir esse objetivo está na
melhoria da identificação da composição
dos raios cósmicos primários, principalmente
nas faixas de energias mais altas”, avaliou.
Segundo pesquisadores participantes da colaboração,
um dos desafios para identificar a fonte e a composição
dessas partículas vindas do espaço é
que elas são medidas de forma indireta.
Quando uma partícula cósmica ultraenergética
atinge a atmosfera terrestre, ela colide com um núcleo
do ar, produzindo novas partículas que, por sua vez,
também colidem e interagem, em um efeito multiplicativo
em cascata, formando um chuveiro atmosférico extenso,
constituído de um bilhão de partículas
ou mais.
O Observatório Auger estuda os raios cósmicos
ultraenergéticos que chegam até a Terra medindo
esses chuveiros atmosféricos extensos produzidos
por eles na atmosfera.
A expectativa é que o programa de aprimoramento
pelo qual o Observatório Auger passará permita
responder questões fundamentais sobre a natureza
dos raios cósmicos de ultra-alta energia.
“Para que o Observatório Pierre Auger atinja
esses objetivos científicos, é importante
melhorar a sensibilidade dos detectores de partículas
e estender as observações até a região
de energia em que se observa a supressão do fluxo
de raios cósmicos de ultra-alta energia”, afirmou
Chinellato.
Proposta
selecionada
De acordo com a pesquisadora, foram apresentadas cinco
propostas de aprimoramento do Observatório Auger
dentro da colaboração internacional. As propostas
foram avaliadas por uma comissão de especialistas
externos.
Cada uma das propostas envolve uma técnica diferente
para a identificação e quantificação
de múons – partículas subatômicas
ultraenergéticas – nos chuveiros atmosféricos.
A determinação do número de múons
permitirá obter informações sobre a
composição dos raios cósmicos de mais
alta energia, explicou Chinellato.
A proposta escolhida, denominada Scintillator Surface Detector
(SSC), consiste em instalar detectores com cintiladores
complementares de 2 m2 no topo de cada um dos 1.660 detectores
de superfície do observatório, ao custo de
US$ 12 milhões – equivalente a um quinto do
custo da construção do observatório.
Espalhados por uma área de 3 mil km2, em uma região
plana ao lado dos Andes, os detectores, que operam ininterruptamente,
consistem em tanques de polietileno, preenchidos com 12
mil litros de água ultrapurificada e instrumentalizados
com sensores fotomultiplicadores.
Quando as partículas de um chuveiro atmosférico
atravessam a água no interior do tanque é
emitida luz que pode ser medida nos sensores.
Antenas acopladas ao tanque transmitem os dados via rádio
para a sede do observatório em Malargüe, de
onde são enviados para análise de cerca de
500 pesquisadores em outros pontos do mundo.
Os detectores de superfície atuais do observatório
já são bastante sensíveis aos múons
presentes nos chuveiros atmosféricos. Ao complementá-los
com novos detectores com cintiladores, contudo, será
possível complementar as medidas da componente eletromagnética,
explicou Chinellato.
“Já há protótipos dos detectores
cintiladores em operação e em fase de teste
no Observatório Auger”, contou. “Estimamos
que nos próximos dois anos uma boa parte dos novos
detectores já estejam instalados e seja possível
tirar medidas mais completas de raios cósmicos de
ultra-alta energia sem interromper a operação
do observatório”, ressaltou.
Elton
Alisson, de Buenos Aires | Agência FAPESP