Mauricio Macri assumirá a presidência da Argentina nesta quinta-feira, em uma cerimônia atípica diante da ausência de Cristina Kirchner, que deixa o posto. A dupla manteve uma disputa sobre como deveria ser a troca de poder. Ontem, Cristina fez seu último discurso no cargo.
Pela primeira vez desde o retorno à democracia em 1983, um presidente prestes a deixar o cargo não entregará a seu sucessor os objetos que sinalizam o comando do país, o bastão e a faixa presidencial. O bloque de deputados ligado a Cristina, por sua vez, anunciou que não participará da cerimônia de posse no Congresso.
Cristina rechaçou a proposta de Macri de receber o bastão e a faixa na Casa Rosada, como é tradicional desde 1868, salvo algumas exceções, e não no Congresso, como desejava a presidente. A Constituição estabelece que, ao tomar posse, o presidente e o vice devem prestar juramento ‘ante o Congresso reunido em Assembleia‘, mas não especifica onde deve ocorrer a entrega dos itens presidenciais.
A presidente que deixa o posto decidiu nem participar da cerimônia no Parlamento, em rechaço à decisão de Macri de acionar a Justiça para resolver a disputa sobre o cerimonial. Uma juíza determinou que o mandato da dirigente peronista terminava à meia-noite de 9 de dezembro, em resposta a uma medida cautelar para que ela se veja impedida de tomar qualquer decisão desde o primeiro minuto de 10 de dezembro.
O presidente provisório do Senado, Federico Pinedo, da coalizão de Macri, exercerá o poder até que o presidente eleito assuma, ao meio-dia (hora local, 13h de Brasília). Pinedo será, portanto, o responsável por passar o bastão e a faixa presidencial na Casa Rosada.
Macri interrompe 12 anos seguidos de kirchnerismo, movimento de centro-esquerda criado no seio do peronismo por Cristina (2007-2015) e seu marido e antecessor, Néstor Kirchner (2003-2007). O período se caracterizou por um exercício de poder personalista, forte intervenção estatal na economia e a implementação de programas sociais abrangentes.
Um tecnocrata conservador que presidiu o time de futebol Boca Juniors, Macri deixará seu cargo de prefeito de Buenos Aires também nesta quinta-feira. O novo presidente terá desafios, como uma inflação de ao menos 27% no ano, segundo economistas privados, restrições à compra de dólares, estagnação econômica, déficit fiscal superior a 7% do Produto Interno Bruto (PIB) e o litígio em Nova York com os chamados ‘fundos abutre‘, investidores norte-americanos que acionaram o país na Justiça cobrando títulos da dívida não saldados.
DISCURSO - A presidente realizou um discurso na noite desta quarta-feira, falando a dezenas de milhares de pessoas que se reuniram na Plaza de Mayo para se despedir dela. Cristina defendeu suas ações no poder, além de atacar o próximo governo.
A líder brincou com a decisão judicial segundo a qual após a meia-noite ela não teria mais poder. ‘Eu não posso falar muito porque depois da meia-noite vou virar uma abóbora‘, comentou. Segundo ela, há ‘uma agenda de fora sendo imposta sobre a região‘, em aparente referência aos Estados Unidos e a outros países que ela vê como inimigos da Argentina. Durante seus mandatos, Cristina frequentemente acusou outros países de intervir nos assuntos da América do Sul, em geral sem dar detalhes.