A história, não muito distante, na Argentina mostra que há sempre o risco de um ‘corralito’ bancário – restrição de movimentos de capitais para travar a sangria de depósitos dos bancos – e transformar em ‘corralón’, ou seja num confisco de depósitos em moeda forte seguido de redenominação coerciva dos depósitos e contratos financeiros para nova moeda acompanhado de uma desvalorização brutal.
Quem o recorda em um curto artigo publicado esta semana no seu blogue é Domingo Cavallo, o ex-ministro da Economia que, a 3 de dezembro de 2001, decretou o ‘corralito’ bancário na Argentina, e se demitiu duas semanas depois quando foi decretado o estado de sítio no país. Cavallo recorda a história da crise argentina para dar um conselho aos credores oficiais e ao governo grego: evitem que venha depois algém a impor a passagem de um ‘corralito’ bancário (como está em vigor agora na Grécia até 7 de julho) para um ‘corralón’.
Cavallo recorda que não foi ele, enquanto ministro, nem o presidente Fernando de la Rúa que decretaram o ‘corralón’ que ficou marcado na memória de todos os argentinos. De um dia para o outro, os depósitos foram confiscados, com a perda de uma larga percentagem pelos seus detentores. O ‘corralón’ impôs, ainda, uma redenominação de dólares para pesos em todos os depósitos em moeda norte-americana – o que, então, se denominou ‘pesificação’ –, o que implicou uma perda de 2/3 do seu valor. O dólar, depois de dez anos com equiparação ao peso, passou a valer 3 pesos. Em suma, uma desvalorização brutal do peso. A equiparação do peso ao dólar foi tomada em 1991 por Cavallo.
A decisão de impor uma ‘pesificação’ forçada foi tomada pelo presidente que sucedeu a três presidentes interinos em onze dias que tomaram a cadeira presidencial na Casa Rosada depois de La Rúa se demitir no meio de uma convulsão política e social gravíssima. A imagem do presidente La Rúa abandonando o palácio presidencial em Buenos Aires num helicóptero ficou registada.
Foi, depois, em janeiro de 2002, que Eduardo Duhalde e o seu ministro de Economia Remes Lenicov decretaram a ‘pesificação” e, de seguida, o default na dívida externa. Em onze dias em dezembro de 2001, a Argentina teve três presidente interinos - Ramón Puerta, Adolfo Saá e Eduardo Camaño e viveu em estado de sítio, saques e 'cacerolazos'. O Parlamento elege depois, a 1 de janeiro, o peronista Duhalde.
Se houver essa ‘transição’ de um ‘corralito’ para um ‘corralón’, Cavallo deixa um recado final: “A Grécia voltará a ser uma economia com inflação elevada e muito intável. Além do mais, a Europa recuperará pouco ou nada dos 240 mil milhões de euro que a Grécia lhe deve. É provável que, no caso do ‘corralito’ se transformar em ‘corralón’, a Grécia acabe por abandonar a União Europeia e entre na órbita geopolítica da Rússia”.
É corrente a ideia de que foi Cavallo que decretou a ‘pesificação’ e o default da dívida argentina e que essa ‘transição’ violenta foi feita no governo de La Rúa. Na realidade, a história foi outra, como recorda o ex-ministro argentino.