Crise na segurança se espalha pela Argentina

IRMA MONTIEL/AFP/JC

A tensão no interior da Argentina tem crescido com temores de novos episódios de saques em meio a protestos das forças policiais que reivindicam melhores salários. Ontem, o governo de Neuquén conseguiu abrir negociações para buscar um acordo com os policiais, que retomarão suas atividades normais em troca de um salário-mínimo de 10 mil pesos (US$ 1.600, pelo câmbio oficial de 6,250 pesos), segundo informou o líder do movimento grevista, Claudio Aroca. No sábado, em Santa Fé, o anúncio inicial de aumento nos salários não agradou a todas as unidades policiais. Muitos não regressaram ao policiamento nas ruas, o que favoreceu a ação de saqueadores. Durante a madrugada de sábado, cerca de 40 pessoas saquearam uma loja de roupas e acessórios e vários outros locais sofreram ameaças e saques isolados.

Na tarde de sábado, a segurança da província foi reforçada pela presença de dois mil homens dos destacamentos federais liderados pelo secretário de Segurança, Sergio Berni, que também se reuniu com o governador da província de Santa Fé, Antonio Bonfatti. Depois de uma forte operação de segurança, as ruas de Rosario voltaram à normalidade. Ontem, o governador anunciou acordo mediante o pagamento de 1.500 pesos para a compra de uniformes e um aumento no valor da hora extra de 45 pesos para 54 pesos a partir de janeiro, além de um bônus especial de fim de ano no valor de 1.500 pesos.

Em Rio Negro, os policiais também mantêm o protesto com paralisação de algumas atividades e reivindicação de salário básico de 10 mil pesos. O policiamento nas ruas está sendo feito pelas forças policiais enviadas pelo governo federal.

Em San Juan e na província de Buenos Aires, a maior e mais importante do país, os governos provinciais se anteciparam à situação de tensão e negociaram rapidamente a concessão de reajustes e prêmios salariais à categoria. Em algumas províncias, o salário básico de um policial é de apenas 900 pesos (US$ 144), em torno de R$ 350,00.

O envio de tropas federais às províncias pretende corrigir o erro cometido pela Casa Rosada de não enviar ajuda ao governador de Córdoba, Juan Manuel de la Sota, rival político dentro do peronismo, na terça e quarta-feira passada, quando mais de mil estabelecimentos comerciais e residências foram saqueados e destruídos. Os saqueadores aproveitaram o protesto da polícia, que se aquartelou e deixou as ruas e os cidadãos sem policiamento. Sem segurança, comerciantes e moradores montaram barricadas armadas para se defender. Houve luta e troca de tiros, uma pessoa morreu e outras 60 ficaram feridas, sendo que 13 delas com ferimentos a bala.

Córdoba deu início ao ‘dezembro quente’

A situação de Córdoba deu a largada ao que na Argentina é conhecido como “diciembre caliente” (dezembro quente), iniciado no dia 19 de dezembro de 2001, quando o povo foi às ruas para pedir a renúncia de Fernando De la Rúa e de todo o seu governo em meio à severa crise política, institucional, econômica e financeira do país.

O agravamento da crise levou o país à moratória de uma dívida de mais de US$ 100 bilhões e elevou a pobreza a quase 60% da população. Enquanto o povo gritava o famoso refrão “que se vaya todos” (que todos saiam do governo) e resistia às manobras de policiais montados que tentavam reprimir a manifestação, durante dois dias e duas noites,  houve 39 mortos e centenas de feridos. Ao mesmo tempo, houve milhares de estabelecimentos saqueados, especialmente na Capital Federal e na província de Buenos Aires.

Dezembro tem registrado temporadas de saques no país. No ano passado, a cidade onde começou a temporada foi Bariloche, espalhando-se pelo interior da Argentina. Neste ano, foi a segunda mais importante província do país, governada por um opositor ao governo de Cristina Kirchner, que deu início ao efeito dominó.

Logo após o episódio de Córdoba, Catamarca sofreu com greve de policiais seguida de saques. Um dia antes, um comerciante da cidade de Glew, na província de Buenos Aires, morreu queimado por um incêndio em seu supermercado, provocado por saqueadores que tinham sido repelidos por ele a tiros minutos antes. Segundo o analista do Observatório da Dívida Social da Universidade Católica da Argentina Agustín Salvia, os saques são explicados pela degradação das oportunidades de inclusão social no país.

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