Por Lucas Rizzi SÃO PAULO, 23 NOV (ANSA) - Mauricio Macri, presidente eleito da Argentina, superou o candidato governista Daniel Scioli com um programa de governo calcado em "mudanças" econômicas e na promessa de erradicar a pobreza no país.
Para chegar a essa ambiciosa meta, ele pretende investir em obras de infraestrutura, urbanizar assentamentos, construir habitações sociais, levantar 3 mil escolas infantis, ampliar benefícios e aumentar a produção agropecuária. Definido como um conservador, Macri usou tal promessa para mostrar que não abandonaria os programas sociais que marcaram os governos kirchneristas.
"Ele teve de mostrar que não vai ser diferente, ou que vai ser diferente para melhor. Macri colocou o tema da pobreza para se diferenciar positivamente de Cristina", explica o coordenador do Instituto de Estudos Econômicos e Internacionais (IEEI) da Unesp, o argentino Luis Fernado Ayerbe.
As promessas de Macri incluem ainda o "Plano Belgrano", que desembolsará US$ 16 bilhões em 10 anos para desenvolver a economia do norte da Argentina, onde há diversos focos de pobreza extrema. Seu governo também criará um Fundo de Reparação Histórica de aproximadamente US$ 7,5 bilhões para a região.
Ainda na área econômica, Macri promete abandonar a banda cambial (regime no qual o câmbio flutua dentro de limites estabelecidos pelo governo) de forma imediata e liberar as importações, embora a primeira medida não seja tão simples assim de se adotar. "Não há condições de se liberar de um dia para o outro, ele deve ser mais pragmático. Mas a tendência é essa", explica Ayerbe. Além disso, o presidente eleito terá de lidar com os "fundos abutres" que detêm títulos da dívida argentina ainda não quitados.
Durante a campanha, o kirchnerismo martelou a ideia de que, com Macri no poder, a Argentina pagaria o valor devido aos hedge funds. "Foi divulgada a ideia de que, com Macri, seria um governo pouco preocupado com os interesses nacionais e mais subordinado aos interesses de Washington", diz o coordenador do IEEI.
Macri também prometeu manter os programas sociais de Cristina Kirchner, que, ao contrário do Bolsa Família no Brasil, passam mais pelo subsídio a tarifas públicas, como de energia, água e transportes. Promover um "tarifaço" dificultaria a vida das pessoas mais necessitadas, indo de encontro às suas metas de combate à pobreza.
"Ele não vai tocar nos programas sociais imediatamente e vai deixar que esses planos continuem", diz o também argentino Osvaldo Coggiola, professor de história contemporânea na USP. No entanto, segundo o especialista, primeiro é preciso entender que tipo de governo Macri irá formar. Apesar de ter se apresentado como um candidato conservador, o prefeito de Buenos Aires representou uma aliança bastante heterogênea, com grupos de diferentes lados do espectro político.
"Primeiro é preciso definir uma equipe de governo, algo que não está claro ainda. Em seguida, definir um governo, que também não está claro", acrescenta. O que parece evidente é que o presidente eleito vai promover uma forte desvalorização do peso argentino, unificar o mercado de câmbio, reajustar tarifas públicas e reatar a relação entre Buenos Aires e o mercado de capitais, o famoso ajuste fiscal.
Os ministérios mais importantes, como os de Economia e do Interior, devem ficar com quadros ditos "técnicos", enquanto os menores provavelmente serão distribuídos entre os grupos políticos que o apoiaram eleitoralmente.
Política externa - Nas relações exteriores, Macri defende a saída do "eixo bolivariano" e a ativação da "cláusula democrática" do Mercosul para suspender a Venezuela devido às denúncias de violações dos direitos humanos de oposicionistas por parte do governo Nicolás Maduro.
Logo em sua primeira coletiva de imprensa após a vitória, ele disse que os abusos cometidos por Caracas são "claros e contundentes". "O que está acontecendo na Venezuela não tem nenhuma ligação com o compromisso democrático dos argentinos", declarou. Essa postura pode gerar uma divisão com o Brasil no Mercosul. "Do ponto de vista político, o tema da Venezuela pode ser um divisor de águas [nas relações entre Argentina e Brasil], dependendo de como ele evoluir", ressalta Ayerbe.
Já no âmbito econômico, as dificuldades enfrentadas pelos dois países devem aproximá-los. Argentina e Brasil são aliados estratégicos e convivem com desafios para recuperar suas economias, por isso, devem focar sua relação no campo financeiro e destravar intercâmbios comerciais. Para Coggiola, Macri irá tratar o Brasil "com muito carinho", ainda mais pela importância que o país representa para a Argentina.
"Ele não vai ter uma identidade como Dilma e Cristina, mas vai tomar distância da crise política brasileira", ressalta. (ANSA)
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