Argentina
Já aprovado no Senado, acordo ratificado por deputados tem grande rejeição. Lei cria 'comissão da verdade' internacional para apurar ataque de 1994
Comunidade judaica e movimentos sociais foram para a porta do Congresso argentino pedir que acordo com Irã não fosse aprovado, mas deputados passaram a lei
(Javier Brusco/EFE)
O governo de Cristina Kirchner conseguiu aprovar no início da madrugada desta quinta-feira, na Câmara dos Deputados, a lei decorrente do acordo com o Irã para criar uma "comissão da verdade" intenacional que vai investigar o atentado de 1994 ao centro judaico Associação Mutual Israelita Argentina (Amia), em Buenos Aires, no qual 85 pessoas morreram e 300 ficaram feridas. A sessão parlamentar ocorreu em meio a um clima tenso, após o governo conduzir uma manobra chamada pela oposição de "escandalosa" para conseguir o número de votos exigidos para a aprovação da medida. Legisladores da bancada kirchnerista que tinham renunciado ao mandato para assumir cargos em governos provinciais simplesmente trocaram a renúncia por pedidos de licença parlamentar, demitindo-se de suas funções nas administrações locais e reassumindo a cadeira de deputado.
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Após 13 horas de debates, mesmo com forte reação dos parlamentares oposicionistas e a pressão de grupos da comunidade judaica e movimentos sociais reunidos na porta do Congresso, a lei já aprovada no Senado passou com 131 votos a favor e 113 contra – eram necessários 129 favoráveis. Os governos da Argentina e do Irã chegaram ao acordo sobre como lidar com o tema no mês passado, mas ele foi amplamente rejeitado por grupos judaicos argentinos e do exterior. Agora, para entrar em vigor, a "comissão da verdade" depende apenas da aprovação do pacto no Parlamento iraniano, aonde o projeto já foi enviado e deve ser votado nos próximos dias.
O caso – Enquanto o Irã nega qualquer ligação com o atentado, autoridades judiciais argentinas acusam funcionários da república islâmica de envolvimento. A Justiça de Buenos Aires exige desde 2006 a extradição de oito iranianos pelo atentado, entre eles o atual ministro da Defesa, Ahmad Vahidi, o ex-presidente Ali Rafsanjani (1989-1997) e o ex-chanceler Ali Akbar Velayati. Em 2007, autoridades argentinas obtiveram mandados de prisão da Interpol para cinco iranianos, incluindo o ministro Vahidi, e um cidadão libanês por acusações de terem ajudado a planejar o ataque ao centro judaico Amia. Porém, o Irã recusou-se a entregar os acusados.
Os suspeitos do atentado não podem ser condenados a não ser que sejam julgados na Argentina, onde ninguém mais foi responsabilizado pelo atentado. E o governo argentino apresenta o acordo com o Irã como a melhor maneira de fazer avançar um caso paralisado. O acordo estipula que a comissão – composta por cinco especialistas judiciais estrangeiros – vai emitir um parecer depois de avaliar a investigação feita pela Argentina para o caso.
Autoridades judiciais de Argentina e Irã, então, vão reunir-se em Teerã para interrogar as pessoas procuradas pela Interpol. Os críticos dizem que é inconstitucional para o Executivo se envolver em questões judiciais, e que as conclusões da comissão internacional poderiam afetar o caso nos tribunais da Argentina. Além disso, o pacto dá credibilidade ao Irã num momento em que os EUA lideram esforços para isolar o país por seu programa nuclear.
A Anistia Internacional na Argentina elogiou o acordo, dizendo que, "embora não garanta de forma alguma o sucesso da investigação, cria uma oportunidade para avançar em direção à justiça e à reparação para as vítimas". Já a oposição ao governo de Cristina Kirchner compara a aprovação do acordo com as leis que protegiam funcionários de nível inferior envolvidos no regime militar da Argentina entre 1976-1983 e anistiou agressores condenados de violar os direitos humanos.
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