Batalha entre Kirchner e Grupo Clarín chega a fase crucial

Vence nesta sexta-feira (07/12) o prazo para os veículos de imprensa na Argentina se adequarem à nova lei de mídia do país. A data marca um dia-chave na batalha entre a presidente Cristina Fernández de Kirchner e o Grupo Clarín, maior grupo de mídia do país e segundo maior da América do Sul.

A nova lei de mídia foi aprovada há três anos pelo Parlamento argentino, mas até hoje há controvérsias a respeito. Pela legislação, o Grupo Clarín tem que apresentar um plano para se desfazer de 150 a 200 licenças excedentes em seu poder.

Do ponto de vista editorial, o Grupo Clarín mantém uma posição claramente oposta ao governo da presidente Cristina Fernández de Kirchner, e acusa-o de usar a lei de mídia como um estratagema político, a fim de calar a boca de seus opositores.

"A melhor  prova disso é que, nos últimos três anos, desde que a lei entrou em vigor, mais de 80% das emissoras de rádio e TV do país encontram-se direta ou indiretamente sob a influência do governo. Por isso entramos com uma queixa contra dois artigos da lei, que consideramos contrários à Constituição do país", explica Martín Etchvers, porta-voz do Grupo Clarín.

Grupo Clarín tem que se desfazer de mais de 150 licenças

Desde que a briga jurídica começou, os dois lados estão levando a cabo uma verdadeira guerra de propaganda. O Grupo Clarín contabiliza o montante de recursos do contribuinte que o governo investe em propaganda política e em transmissões de partidas de futebol por seus próprios canais. E o governo tenta disseminar uma imagem dos líderes do grupo de mídia como empresários ambiciosos, que querem manter o monopólio do mercado, manipulando e mentindo para a população.

Ironicamente, foi o antecessor da presidente Cristina Fernández de Kirchner, seu falecido marido Néstor Kirchner, que ajudou a transformar o Clarín em um grupo tão poderoso. Naquela época, diga-se de passagem, o grupo ainda se mantinha aliado ao governo.

Liberdade de opinião em risco?

Agora chegou a hora: o governo declarou que o Clarín terá que devolver até o fim desta semana as licenças excedentes de que dispõe, em respeito à nova lei. Há quem acredite que a lei será usada pelo governo para forçar uma rápida decisão da Suprema Corte na batalha legal com o grupo de mídia. Caso os juízes responsáveis não respeitem a lei em suas decisões, isso será considerado um caso de "insurreição".

Mesmo os políticos que defendem uma limitação do poder dos grandes grupos de mídia no mercado duvidam que a postura do governo seja imparcial. "A conduta da presidente contra a Justiça transforma o que seria um problema meramente econômico para o Clarín em uma questão de liberdade de expressão", diz o senador oposicionista Mario Cimadevilla. O parlamentar é um dos que impediram a nomeação de um juiz próximo ao governo para o caso Clarín.

Sede da Rádio Sur, em Buenos Aires

Democratização e diversidade

Mas nem todos os veículos de imprensa do país se opõem às novas regras. Para as pequenas emissoras, a decisão significa a democratização da mídia na Argentina. "A nova lei de mídia foi e continua sendo decisiva para nós", diz Inés Farina, apresentadora da Rádio Sur, em Buenos Aires. "E não apenas para nós, rádios comunitárias e alternativas, mas também para toda a sociedade. Com ela, temos uma democracia melhor e mais liberdade de opinião para todos", completa.

A Radio Sur é uma rádio comunitária de pequeno porte e não comercial, como outras do gênero. As rádios comunitárias na Argentina são normalmente mantidas por organizações sociais, universidades ou representações de grupos indígenas. Elas irão se beneficiar da nova lei no país, pois receberão licenças de transmissão com mais facilidade.

A antiga lei, aprovada ainda durante o período da ditadura militar, nos anos 1970, só permitia a pessoas físicas ou instituições a propriedade de emissoras de rádio ou televisão. As novas regras, ao contrário, deverão trazer mais diversidade e democracia ao cenário da mídia no país.

Inés Farina, apresentadora da Rádio Sur

A ideia é que a mídia não fique concentrada nas mãos de poucos e poderosos empresários. As frequências de emissão serão divididas da seguinte forma: um terço das concessões a empresas privadas, um terço a instituições estatais e um terço a operadores não comerciais. E quem estiver em poder de um número maior de licenças que o permitido, terá que devolver as excedentes.

Os defensores da lei acentuam, por outro lado, que ela cerceia o poder dos grandes grupos de mídia no país. "Acreditamos que será uma longa e muito árdua batalha contra os grandes grupos multimídia. Eles só se beneficiaram da situação nos últimos anos. Isso tem que acabar, enfim, agora. Pois a lei vigora para todos", diz Inés Farina.

Desta forma todas as camadas da população podem teoricamente dar início a seus projetos de mídia. Porém, como as rádios comunitárias são muitas vezes dependentes financeiramente do Estado, a lei aumenta a influência do governo sobre o cenário da mídia no país. Além disso, é o Estado quem inspeciona, a cada dois anos, a concessão das licenças.

Autor: Mark Koch (sv)
Revisão: Francis França

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