Buenos Aires. A Argentina vai às urnas neste domingo para definir, em segundo turno, o sucessor da presidente Cristina Kirchner. Os dois candidatos, o oficialista Daniel Scioli e o conservador Mauricio Macri, têm origens familiares semelhantes, são da mesma geração e alegam ser bons amigos, mas defendem modelos de país diferentes em temas fundamentais para a sociedade argentina.
No primeiro turno, Scioli conseguiu mais votos, com 37% do total, do que Macri, prefeito em fim de mandato de Buenos Aires, com 34,1%. Porém, o opositor abriu vantagem no segundo turno e passou a liderar as pesquisas de intenção de voto.
Scioli se apresenta como a continuidade a 12 anos de gestão “kirchnerista”, mas com um estilo diferente da confrontação permanente adotado pela presidente Cristina Kirchner. O candidato afirma que corrigirá o rumo do atual governo, mas sem cair nas políticas liberais, que representam uma “volta ao passado”.
Macri se apresenta como a “verdadeira mudança”, mas baseou sua campanha eleitoral em discutir questões formais. Promete dialogar e propõe união, mas evita definições políticas. As promessas diferem de suas posturas prévias e dos projetos revelados por seus colaboradores.
Fim de um ciclo
Scioli é “um perdedor moral, há um clima de derrota no seio do poder”, considerou o cientista político Ricardo Rouvier.
Desde as primeiras eleições democráticas em 1912, todos os presidentes eleitos vieram de duas formações: o peronismo, movimento fundado pelo ex-presidente Juan Peron, e a União Cívica Nacional (UCR, centro-esquerda).
“Se Macri for eleito presidente, talvez emergirá um bipartidarismo, com uma força mais populista centrada na redistribuição de riquezas, o peronismo, e uma outra mais de centro-direita, dando prioridade à eficácia da gestão, a de Macri”, prevê ocientista político Rosendo Fraga.
Mauricio Macri não apenas seduziu as classes urbanas e rurais mais abastadas, fervorosos anti-peronistas ou anti-kirchneristas. Operários, moradores de favelas, esses também votaram pelo prefeito de Buenos Aires – filho de um poderoso industrial e ex-presidente do Boca Juniors, time de futebol mais popular do país.
“Macri faz parte da nova direita latino-americana. Mas diferentemente de um republicano dos Estados Unidos, que diz o que pensa e o que faz, ele tem um discurso impregnado de populismo”, estima a socióloga Camila Matrero.
O processo eleitoral de 2015 marca o fim de um ciclo. Não há mais um sucessor designado por Cristina Kirchner, apenas um pacto com Scioli, membro da coalizão de esquerda no poder que aparecia bem nas pesquisas de intenção de voto.
Balanço da época: os Kirchner levaram à justiça 600 militares responsáveis por crimes durante a última ditadura, aumentaram o consumo interno, garantiram salários alinhados com a forte inflação, estatizaram a empresa petroleira nacional e promoveram uma política econômica protecionista.
“O eleitorado pede outra coisa, uma abertura para o mundo, o fim das restrições ao acesso às divisas”, afirmou o cientista político Gustavo Córdoba, e neste contexto, “há um leve movimento para a direita” no tabuleiro político.
Para o sociólogo Federico Gonzalez, “se nós olharmos o passado de Macri, ele é de direita e não esconde. Ele é liberal de formação, mas evoluiu”.
O veredicto será dado nas urnas neste domingo, 22. O novo presidente terá de ser conciliador, já que não haverá maioria parlamentar.