Argentina se aproxima do precípicio! Ou não…

Está começando hoje, em Caracas, a luta da Argentina para evitar o retorno do caos econômico. Na reunião do Mercosul, a busca será de apoio regional contra os credores espetulativos. Paralelamente, será tentado um acordo improvável. Amanhã, no dia decisivo, representantes do governo e dos fundos se reúnem cara a cara.

Há questões semânticas: já prevendo o default visto como inevitável, o governo argentino diz que na verdade não se trata de calote, porque tentou pagar e foi impedido pela Justiça americana.

E há proselitismos: hoje, em Caracas, o dia é de vociferar contra os “fundos abutres”, que não só põem a Argentina em situação difícil, mas representa um risco sistêmico evidente.

Mas o fato é que, 12 anos depois do “megacalote” da crise de 2001, a Argentina caminha para um novo calote ou sejo o que for a ausência de pagamento, mesmo que involuntário.

A Argentina voltar a ser um pária, depois de ter negociado a dívida com 92,6% dos seus credores externos, leva analistas de mercado a dizerem, por exemplo, para o Brasil diversificar mais os destinos das suas exportações. Os respingos na economia brasileira são iminentes.

Neste 30 de julho, vencem as parcelas que a Argentina tenta pagar. A Argentina fez o depósito, mas os recursos foram bloqueados pela Justiça americana. Para desbloqueá-los, o país teria de cumprir uma decisão judicial que ordenou o pagamento de US$ 1,3 bilhão aos tais fundos especulativos liderados por NML e Aurelius, a quem o governo argentino chama de “abutres”.

Esses fundos têm em mãos papéis da dívida de uma minoria que não quis renegociar a reestruturação e que foram à Justiça americana exigir o pagamento integral. A Argentina disse que não teria dinheiro para todos. Mas o juiz federal americano Thomas Griesa sustenta que o governo argentino não pode privilegiar credores. Daí o impasse.

A presidente Cristina Kirchner teme que a dívida suba em mais de US$ 120 bilhões. Acha que qualquer novo acordo com credores ameaça o processo de reestruturação da dívida realizado em 2005 e 2010, que permitiram ao país sul-americano retornar ao mercado internacional.

O juiz Griesa insiste: as partes têm de negociar até o último instante – amanhã.

A Argentina se detém sobretudo naquilo que pode ser definido como uma armadilha: a cláusula no contrato de todos os títulos emitidos nas trocas dos anos 2005 e 2010. A cláusula chamada Rufo (Rights Upon Future Offers) trata de direitos sobre ofertas futuras da renegociação. Dá a garantia de poder exigir as mesmas condições de qualquer outra eventual oferta voluntária futura aos chamados “holdouts” (os que não aderiram à reestruturação, chamados de “abutres”).

Em resumo: se a Argentina pagar 100% da dívida a algum credor, todos os outros poderão cobrar o mesmo. Tal cláusula vence em 31 de dezembro.

Nas negociações, a Argentina tenta estabelecer uma alternativa que impeça esse quadro sombrio, a razão de todo o desespero atual do governo Cristina. Uma saída seria um acordo judicial com o juiz impondo termos de pagamento e percentuais, tirando um pouco da pressão sobre o governo argentino. Alegando que a oferta não foi voluntário, haveria o argumento de que a cláusula Rufo não poderia ser disparada. Enfim, questões jurídicas.

A Argentina tenta ganhar tempo.

O juiz Griesa insiste num acordo.

Quais os possíveis cenários?

1) Acordo: evita-se o calote, mas é aberta uma brecha para enxurrada de ações de credores exigindo as mesmas condições, o que poderia elevar valor da dívida em US$ 120 bilhões

2) Suspensão da decisão judicial: o pagamento da parcela da dívida que vence amanhã é desbloqueado e se evita o calote, adiando o problema para setembro, quando vence a próxima prestação. Permanece, porém, o impasse em relação ao valor de US$ 1,3 bilhão cobrado pelos fundos especulativos, os chamados “abutres”.

3) Calote: a Argentina se afunda na crise, e a evasão de divisas leva à escassez de dólares. O país terá de voltar a negociar com os credores e buscar alternativas jurídicas para um acordo com os ‘abutres’ sem correr o risco de que outros investidores exijam o mesmo tratamento.

Enfim, certamente o drama não termina amanhã.

Leave a Reply