Argentina e Brasil: parceiros comerciais, turismo e futuro do Mercosul

* Carlos Henrique Costa da Silva

As relações comerciais e diplomáticas entre Brasil e Argentina sempre foram marcadas por períodos que mesclam discordância e impasses com outros de calmarias e alinhamentos bilaterais. Atualmente, ainda que haja esforços políticos por parte dos governos de Cristina Kirchner e Dilma Rousseff no sentido de delinear estratégias de crescimento econômico visando benefícios para ambos países, algumas características conjunturais da Argentina tem dificultado a consolidação do Mercosul. Desde 2001, a Argentina tenta se reerguer econômica e politicamente. No entanto, analisando as últimas medidas do Governo Federal, percebe-se que o país tem tomado medidas muito controversas.

Quem anda pelas ruas de Buenos Aires, logo percebe a clara erupção e procura por dólares, euros e reais trazidos pelas turistas. Desde 2011, uma série de medidas restritivas à comercialização de moedas estrangeiras está sendo posta em prática, para tentar segurar a fuga de capitais do país e que tem se revelado como constrangedora do direito de ir e vir da população. O cidadão argentino não tem plena permissão para comprar moeda estrangeira, nem sequer para fazer turismo. As compras realizadas com cartão de crédito no exterior ou pela internet em sites estrangeiros são taxadas em 20% na tentativa de proibir o comércio internacional.

Há uma clara disputa de poder entre os meios midiáticos e o governo federal. O poder de Kirchner tenta, de todas as maneiras, cessar e controlar a publicação de alguns jornais, revistas e até canais de televisão, que publicam notícias criticando o governo, mostrando-se nada democrático. Porém, as medidas mais absurdas deste governo se materializam através da manipulação de dados e estatísticas federais, como inflação, produto interno bruto, renda per capita e índice de investimentos estrangeiros. Entre 2004 e 2010, os dados oficiais mostram que a Argentina teve taxas de crescimento econômico real equiparáveis à China.

Os dados inflacionários para este período têm média de 8% ao ano. No entanto, a realidade dos fatos é bem diferente. A inflação medida por outros órgãos públicos pertencentes a partidos opositores mostram que a taxa anual girou ao redor dos 25% nos últimos 3 anos, o que indica uma deterioração do poder de compra do cidadão, já que a taxa real de crescimento da renda foi inferior aos 10% anuais. Outro fator que ajuda a verificar que há problemas graves nestas estatísticas é quando se analisa a circulação de papel moeda pelo país. A nota de maior valor - 100 pesos argentinos - já equivale a 65% de todas as notas em circulação no mercado. Este dado auxilia a ver que o governo não quer admitir o circulo inflacionário, pois não lança um bilhete de 200 ou 500 pesos para facilitar as transações.

Vale a pergunta: No que estas medidas internas do funcionamento da economia Argentina, influenciam o Brasil? Nos últimos 10 anos, os Argentinos são o povo que mais visita o Brasil, respondendo por 30% dos turistas estrangeiros. Cidades importantes de nosso litoral como Florianópolis, Torres, Balneário Camboriú e Búzios, são refúgios de hordas de argentinos durante o verão. O controle cambiário aos turistas já tem assustado aos comerciantes destas localidades que temem perder receitas pela queda no fluxo turístico. A crescente inflação já tem afugentado aos turistas em visita à Argentina, fazendo com que Buenos Aires deixasse de ser a cidade mais visitada pelos brasileiros no exterior perdendo o posto para Miami e Nova York. Há grande quantidade de notas falsas em circulação que dificulta a conferência e traz insegurança para o turista.

Além destes fatores vinculados ao turismo, estes problemas conjunturais argentinos têm trazido inseguranças quanto ao funcionamento do Mercosul. Este bloco comercial tem funcionado de maneira bastante precária devido às diversas medidas protecionistas entre os seus próprios membros. Entretanto, a Argentina tem taxado produtos brasileiros e liberado de impostos produtos importados provenientes de outros mercados, como da Ásia. Porém, o Itamaraty continua com sua política internacional apaziguadora na tentativa de que nosso parceiro comercial vizinho, possa se recuperar economicamente e voltar a produzir efeitos positivos para o crescimento regional. Em direção oposta, vê-se Chile, Colômbia e Peru aproximando-se cada vez mais através de acordos bilaterais cooperativos, alcançando taxas de crescimento anual do PIB muito superiores aos de Brasil e Argentina.

Desta forma, é interessante fazer um alerta para os exportadores e importadores brasileiros que, há outros mercados latino-americanos vizinhos com políticas internacionais muito mais interessantes do que o tradicional parceiro "hermano". É momento de repensar as estratégias de integração para além do mercado argentino e vislumbrar novas oportunidades no mercado andino e pacífico.

* Carlos Henrique Costa da Silva é doutor em Geografia. Professor do Departamento de Geografia, Turismo e Humanidades da UFSCar/Sorocaba. Em 2012 realizou Pós-doutorado na Universidade de Buenos Aires.

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